No último dia de abril de 2008, a Marvel Studios lançava o primeiro filme do Homem de Ferro. O estúdio que nasceu em 1993 como Marvel Films, um braço da Marvel Entertainment, tinha como intenção licenciar produções dos personagens da editora para outros estúdios, uma das muitas medidas tomadas pela empresa para tentar vencer uma grave crise financeira. Quinze anos depois, a obra que marcaria o começo das produções próprias da empresa e seria o pontapé inicial de uma inimitável trajetória de sucesso saía como uma produção independente, financiada com empréstimo, estrelada por um talentoso ator cuja carreira estava no limbo e comandada por um diretor pouco conhecido. Muitos ingredientes de alta volatilidade em uma aposta de risco do estúdio comandado por Kevin Feige, um auto-proclamado “marvete“, que começou sua carreira como assistente na The Donners’ Company e trabalhou em todos os 15 filmes baseados em personagens da Marvel lançados por New Line, Fox, Lions Gate, Sony e Universal entre 1998 e 2007.

Quem poderia imaginar que dez anos depois aquele pequeno estúdio da famosa editora de quadrinhos norte-americana que quase faliu nos anos 1990 teria erguido um império, hoje sob a égide da The Walt Disney Company, o maior conglomerado de mídia e entretenimento do planeta? Que produziria 19 filmes – e contando –, vários deles com orçamentos vultuosos (não mais obtidos por empréstimos), arrecadaria mais de US$ 15 bilhões nesse percurso e conquistaria três (a quarta parece a caminho) das dez maiores bilheterias da história do cinema? Que teria o privilégio do ineditismo cinematográfico na criação de um universo interligado e extremamente coeso de múltiplas franquias (dez até o momento, uma nova a caminho e variadas possibilidades para o futuro) que transportou para a sétima arte um modelo de cruzamento de enredos e personagens que é a marca dos quadrinhos de super-heróis desde os anos 1960?

Difícil pensar que alguém pudesse imaginar tudo isso, mas aconteceu. Durante essa década de produções cada vez mais grandiosas, elencos estelares, muitos personagens e conexões aprofundadas entre as franquias, o universo cinematográfico da Marvel redefiniu o cinema de entretenimento da nossa época, tornou-se a referência no modo de se fazer blockbusters e estabeleceu uma tendência na indústria – que vários outros estúdios, com personagens de quadrinhos ou não, tentam emular. Vingadores: Guerra Infinita surge para dar um passo a mais nessa trajetória: se Os Vingadores (2012) uniu 4 franquias em uma (e a sua sequência seguiu a mesma estrutura), o terceiro filme dos super-heróis mais poderosos da Terra apresenta um surreal crossover entre 10 franquias.

Em busca de poder

Atenção, a partir de agora o texto contém spoilers.

Vingadores: Guerra Infinita começa imediatamente após o final de Thor: Ragnarok (2017) (clique aqui para conferir a crítica) com uma sequência brutal que mostra o nível de ameaça que Thanos (Josh Brolin) representa: a nave que resgatou todos os sobreviventes de Asgard está destruída, quase todo mundo foi morto e Thor (Chris Hemsworth), Hulk (Mark Ruffalo), Loki (Tom Hiddleston) e Heimdall (Idris Elba) estão à mercê da Ordem Negra e do Titã Louco, que deseja obter do Deus da Trapaça o paradeiro do tesseract, a joia do espaço. Antes de ser morto, Heimdall consegue enviar um humilhado Hulk para a Terra. Loki entrega a joia para salvar o seu irmão, sendo morto facilmente por Thanos quando tenta atacá-lo. O local é destruído e Thor é largado semimorto na imensidão espacial.

Não poderia haver um início melhor. Em poucos minutos os dois super-heróis mais poderosos da Marvel são completamente subjugados por um Thanos em posse de apenas uma joia do infinito, enquanto Loki e Heimdall são assassinados com extrema facilidade. Qualquer dúvida que pudesse existir sobre a gravidade da ameaça que o Titã Louco representa é completamente dissipada.

Emulando o Surfista Prateado em Desafio Infinito, o Hulk despenca no Sanctum Sanctorum, encontrando Doutor Estranho (Benedict Cumberbatch) e Wong (Benedict Wong) e alertando os protetores místicos do planeta sobre a ameaça que se avizinha. O Doutor Estranho vai atrás do Homem de Ferro (Robert Downey Jr.). Enquanto todos eles escutam de Banner tudo que é preciso saber sobre as intenções de Thanos, a Ordem Negra chega à Terra, provocando o caos em Nova York.

Fauce de Ébano (Tom Vaughan-Lawlor) e Cull Obsidian (Terry Notary) confrontam os três, atrás da joia do tempo no Olho de Agamotto, e um Homem-Aranha (Tom Holland) que ouvia música tranquilamente no ônibus escolar é desperto pelo sentido de aranha, juntando-se ao grupo, que termina com Doutor Estranho capturado e torturado, Homem de Ferro e Homem-Aranha escondidos na nave espacial já em órbita, e Bruce Banner indo atrás do renegado Capitão América (Chris Evans).

No espaço, a Milano responde ao pedido de socorro da nave asgardiana e os Guardiões da Galáxia encontram apenas destruição, até que um Thor desacordado bate na frente da nave. Diante do cenário que se desenha, Thor, Rocket (Bradley Cooper) e Groot (Vin Diesel) partem em busca de uma estrela de nêutron onde será forjada a nova arma do Deus do Trovão, enquanto Senhor das Estrelas (Chris Pratt), Gamora (Zoë Saldaña), Mantis (Pom Klementieff) e Drax (Dave Bautista) vão para Luganenhum na intenção de impedir que Thanos consiga a joia da realidade que está com o Colecionador (Benício del Toro).

Nessa altura, Capitão América, Viúva Negra (Scarlett Johansson) e Falcão (Anthony Mackie) salvam a Feiticeira Escarlate (Elizabeth Olsen) e o Visão (Paul Bettany) do ataque quase mortal de Próxima Meia-Noite (Carrie Coon) e Corvus Glaive (Michael James Shaw) na Escócia e reúnem-se ao Máquina de Combate (Don Cheadle) na base dos Vingadores, onde a presença holográfica do secretário Ross (William Hurt) faz mais uma ponte com o Acordo de Sokovia, partindo em seguida para a nação do Pantera Negra (Chadwick Boseman) com a intenção de curar os ferimentos do sintozoide, proteger a joia da mente e preparar a resistência do planeta Terra contra Thanos.

No espaço, uma nova divisão acontece, e enquanto Gamora é levada por Thanos para a sua nave – onde Nebula (Karen Gillan) está sendo torturada –, Doutor Estranho, Homem de Ferro e Homem-Aranha encontram-se com Senhor das Estrelas, Drax e Mantis em Titã, formando um novo time na batalha contra o Titã Louco. Desse modo, com muita rapidez (sem conveniências muito forçadas), as peças do tabuleiro de Vingadores: Guerra Infinita se posicionam em seus respectivos lugares, interconectando-se através de saídas interessantes e fazendo a narrativa se desenvolver com fluidez e lógica.

Uma escolha formidável e ousada de Kevin Feige, Anthony Russo, Joe Russo, Christopher Markus e Stephen McFeely estabelece um elemento diferencial para o longa-metragem e funciona como um elo perfeito de conexão entre tantos núcleos diferentes de uma história serpenteante que passeia por vários mundos e cenários distintos: contar a história sob a perspectiva do antagonista. Vingadores: Guerra Infinita poderia perfeitamente se chamar A jornada de Thanos.

As ações e intenções do Titã Louco são como a linha e a agulha que costuram toda uma narrativa que finaliza com muita emoção e impacto os dez primeiros anos de universo cinematográfico da Marvel. Desde sua primeira aparição, em 2012, o personagem vem exercendo uma influência oculta em todos os filmes do estúdio, nunca tomando o foco principal das aventuras individuais, mas sempre insinuando-se, pela presença propriamente dita (Os Vingadores e Guardiões da Galáxia) ou através das joias do infinito (Vingadores: Era de Ultron e Doutor Estranho).

Thanos é um destruidor de mundos de inspirações malthusianas: o seu desejo é conter o aumento populacional desenfreado. Para alcançar o almejado equilíbrio, invade planetas e dizima metade de suas populações: através do extermínio indiscriminado e sem paixões deixa para trás um irônico legado da prosperidade. O excesso de gente e a escassez de recursos levaram Titã, sua terra natal, ao colapso – Thanos previu tudo isso, avisou os seus, apresentou uma solução radical, mas não foi ouvido; ser chamado de louco foi a sua recompensa.

Disposto a tornar a sua missão mais rápida e completamente eficiente, Thanos quer obter para si as seis joias do infinito, artefatos de imenso poder que reúnem todas as características essenciais da existência. Em posse de todas elas, um estalar de dedos será o suficiente para exterminar aleatoriamente, sem privilégios a ninguém, metade da vida senciente de todo o universo.

Por mais que seja um personagem inteiramente construído em computação gráfica através de captura de performance, Thanos impressiona – e muito. Todas as nuances da excelente atuação de Josh Brolin foram capturadas pelo primoroso trabalho da Weta Digital e da Industrial Light & Magic. A interpretação do experiente ator transparece em suas expressões e o roteiro afiado auxilia muito nesse processo. O Titã Louco é conhecedor do que quer e do que precisa fazer para consegui-lo. Há justificativa plausível em todas as suas motivações, por mais que os efeitos dos seus atos sejam, no fim das contas, mortíferos.

Brolin retira de Thanos toda a vilania exacerbada e o histerismo desvairado típico de vilões que desejam o extermínio de pessoas. Vai para o lado oposto: busca a sua humanidade. E incrivelmente consegue encontrá-la, extraí-la e expô-la. Sua voz é de uma placidez que impressiona e confere peso a todas as falas do Titã Louco. O ator constrói um personagem que esbanja uma tranquilidade ímpar diante daquela que converteu-se em sua missão da vida, mas que ele não realiza com sadismo ou prazer. Sereno e calmo, firme em sua crença, mata apenas se houver necessidade e não se regozija com os assassínios – vários heróis são poupados durante a sua jornada.

Cônscio de que suas mãos verterão muito sangue e consumirão muitas vidas, mas que tudo isso será necessário para que o universo caminhe para a prosperidade e para a vida (por mais que isso soe contraditório), ainda há espaço para amor em Thanos: não pela Senhora Morte, como nas HQs, mas pela filha adotiva – e todo o arco que explora a relação do personagem com Gamora é profundamente emocional e de suma importância para todo o desenvolvimento narrativo.

O Titã Louco se emociona. Chora – de verdade, sem falsidades ou enganações. A sequência no planeta Vormir traz de volta o Caveira Vermelha (Ross Marquand) como guardião da joia da alma e constrói um dos momentos mais dramáticos do filme, quando Thanos precisa trocar a única coisa que ama nesse mundo pela joia – uma alma por outra. Ele faz o sacrifício necessário para alcançar o seu intento, mesmo que isso atinja fundo em sua alma e custe tudo – e efetivamente custa. Essa é sua única fraqueza. E talvez seja ela a indicar um caminho de esperança para os heróis no futuro.

Tomando Vingadores: Guerra Infinita inteiro para si, sem necessidade de flashbacks incansáveis sobre o seu passado (apenas um que ilustra a relação com uma Gamora ainda infante), Thanos convence em todas as cenas, com seu carisma, sua visão de mundo e suas ideias, por mais erradas e absurdas que sejam. Portando-se sempre com uma natural superioridade (sem parecer arrogante), o amálgama das expressões de Josh Brolin com pixels e mais pixels de texturas cria um antagonista imponente que desde já marca seu nome na galeria dos grandes vilões da história do cinema. Ainda assim, há espaço para todos os super-heróis, cujas histórias gravitam em torno da ameaça de Thanos, terem os seus momentos e arcos – uns mais que outros, como era de se esperar.

A direção dos irmãos Anthony e Joe Russo é repleta de vitalidade e excelência. Não foi uma tarefa simples: vindos dos espetaculares Capitão América: O Soldado Invernal (2014) e Capitão América: Guerra Civil (2016), os dois dessa vez conduziram praticamente uma orquestra, em um filme inteiro que se constituiu em um desafio monumental. Precisaram conciliar aventuras que ocorrem simultaneamente na Terra e em outros planetas, um elenco numeroso que muitas vezes nem pôde se encontrar no set, e tons, visuais e acentos de múltiplas franquias. E conseguiram.

Vingadores: Guerra Infinita é tecnicamente impecável. Inteiramente gravado em IMAX, todo o visual é muito bonito, desde as locações reais, em Edimburgo e Nova York, até os cenários fantásticos das HQs: Titã, Vormir, Nidavellir, Wakanda e Luganenhum. A fotografia de Trent Opaloch transita com perfeição entre os contrastantes núcleos de mais realismo (na Terra) e mais fantasia (no espaço), utilizando-se também de características trazidas das franquias participantes. É como uma teia que agrupa elementos diferentes mas que se combinam em uma coisa só.

Aliás, esse é um dos grandes acertos do filme: nenhum personagem ou franquia é descaracterizada. O propalado trabalho de organização das produções da Marvel atinge seu ápice aqui. Quando os Guardiões da Galáxia surgem pela primeira vez é ao som de uma canção, a estilosa The Rubberband Man, da banda The Spinners, do mesmo jeito que acontece nos filmes do grupo. Além disso, dentro da Milano acompanhamos o mesmo relacionamento engraçado e familiar (“olha a língua, Groot!“) entre os personagens. Thor ressurge com um prólogo extremamente sombrio, mas no contato com os Guardiões recupera o acento cômico de Thor: Ragnarok. E o mesmo se dá com os outros personagens: Capitão, Pantera, Doutor Estranho, Homem-Aranha, Homem de Ferro… todos mantêm as características de suas últimas aparições nos filmes da Marvel.

Os efeitos visuais situam-se com facilidade entre os melhores já entregues pelo estúdio – que já produziu muitos filmes excelentes nesse quesito – e Thanos é o melhor exemplo disso: você se esquece em muitos momentos que se trata de um personagem todo em CGI; ele tem peso e presença. A trilha sonora ficou a cargo do experiente e premiado maestro Alan Silvestri. Compositor dos temas de Forrest Gump: O Contador de Histórias (1994) e da trilogia De Volta Para o Futuro (1985-1990), Silvestri também foi o responsável pela trilha original de Os Vingadores, a mais marcante das trilhas do universo cinematográfico da Marvel. Em Vingadores: Guerra Infinita ele investe em temas que ressaltam o caráter épico e urgente do longa-metragem.

Os irmãos Russo entregam um filme que tem muita história, cuja narrativa ocorre em um frenesi de tirar o fôlego, mas sem nenhuma gordura: não falta nada no filme e também não sobra. A edição de Jeffrey Ford e Matthew Schmidt é extremamente competente ao passear pelas numerosas subtramas sem esquecer de nenhuma delas por muito tempo: o filme vai e volta em seus núcleos, em uma valsa sincronizada de encontros, reencontros, planos, armações, perdas e surpresas, sempre deixando o espectador atento ao que virá em seguida. Surge uma vontade de ter visto alguns minutos da destruição de Xandar (mencionada no começo) na busca pela joia do poder, talvez outras situações a mais, mas a invisibilidade de tais coisas não interfere no saldo final – está no filme o que precisa estar.

O roteiro de Christopher Markus e Stephen McFeely é uma aula, simplesmente. De como conectar múltiplos personagens, eventos distintos e mitologias ímpares, revisitar histórias de filmes anteriores, estabelecer diferentes arcos narrativos e conceder explicações didáticas sobre motivações e novas paragens em poucas – e ágeis – linhas de diálogo. Um investimento emocional prévio é bem-vindo, ter visto todos os filmes anteriores da Marvel ajuda, faz com que você seja capaz de perceber cada pequena referência a coisas que aconteceram em outros filmes, mas um espectador de primeira viagem não se sentirá inteiramente perdido em Vingadores: Guerra Infinita.

Há nesse filme muito do legado deixado por John Ford para toda a história do cinema em No Tempo das Diligências (1939), na sua forma eficiente de introduzir personagens e histórias identificáveis ao público com imensa rapidez, tanto através de diálogos quanto a partir de cenas marcantes – do jovem John Wayne que surge no quadro segurando uma sela em uma mão e girando um rifle na outra, enquanto a câmera movimenta-se na sua direção, para um Benedict Cumberbatch que brota de um portal na frente de Robert Downey Jr. e Gwyneth Paltrow, um Chris Evans que surge das sombras e segura o ataque de uma lança, ou um Thanos que surge imponente na frente dos heróis, é evidente uma conexão estilística que perpassa a história do cinema de entretenimento norte-americano.

O humor característico dos filmes da Marvel também se faz presente no acerto dessas conexões. O “Anjo Pirata”, a “Lebre” e a “Árvore” entram em sintonia imediata: a relação dos três é hilária. O arco dos personagens em busca da rompe-tormentas é fantástico. Em Nidavellir eles encontram o amargurado Rei Eitri (Peter Dinklage), único anão que foi deixado vivo por Thanos depois de serem obrigados a construir uma manopla capaz de manusear as seis joias ao mesmo tempo. Concentrando em si toda a energia de uma estrela, um poderoso Thor auxilia Eitri na confecção da arma, que recebe uma solução extremamente criativa para o cabo – e representa o ponto de virada de um Groot que até então dava a impressão de que passaria o filme inteiro jogando Space Defender.

Uma constante entre os heróis da Marvel, os enfrentamentos iniciais também se fazem presentes. Steve e Tony ainda não se falam (e acabam não se encontrando durante o filme inteiro) e as fissuras de Capitão América: Guerra Civil são visíveis, mas diante da ameaça maior os heróis na Terra se unem. Só que nada é fácil e imediato. O sarcasmo de Tony, os traços de arrogância de Stephen, e o ego gigantesco dos dois, provocam faíscas entre eles; Peter Quill sente ciúmes da presença de Thor em sua nave e também não se acerta com Tony de imediato – no meio disso tudo, a ingenuidade e o deslumbre adolescente de Peter Parker trazem tempero a essa mistura característica de brigas antes de uniões.

As cenas de ação seguem o nível de excelência que os Russo já haviam apresentado nos seus dois filmes anteriores, indo além quando eles se aproveitam das possibilidades infinitas de interações entre tantos personagens e novos poderes. Já de início temos um Thanos versus Hulk brutal que mais parece uma luta de boxe e termina com o Gigante Esmeralda humilhado – e receoso de voltar a assumir o controle. O pequeno combate em Nova York, envolvendo Homem de Ferro, Doutor Estranho, Wong, Homem-Aranha, Fauce de Ébano e Cull Obsidian pelas ruas e parques da cidade já dá o tom de como será a interação entre os poderes dos super-heróis nas próximas sequências.

Na Escócia, um combate noturno de cortes rápidos e câmera próxima, bem ao estilo dos Russo, envolve Capitão América, Falcão e Viúva Negra contra Próxima Meia-Noite e Corvus Glaive, que acuavam Wanda e Visão em busca da joia do infinito na testa do sintozoide. Em Luganenhum, lar do Colecionador, os Guardiões da Galáxia atacam Thanos e vemos o Titã usando a joia da realidade para transformar Drax e Mantis em cubos e fitas, tal qual acontece na HQ Desafio Infinito.

No terceiro ato, a batalha de Wakanda, envolvendo Pantera Negra, Capitão América, Viúva Negra, Máquina de Combate, Falcão, Bucky, Okoye, M’Baku, Banner na Hulkbuster e todo o exército do país contra as criaturas alienígenas de Thanos, lideradas por Próxima Meia-Noite e Cull Obsidion, entrega ótimas combinações como Viúva e Okoye, Máquina e Falcão e Capitão e Pantera. Belas tomadas aéreas dão a dimensão exata de uma guerra em grande escala. A Feiticeira Escarlate mostra a extensão dos seus poderes em uma participação crucial na reta final, mas o clímax é atingido com a chegada triunfante de Thor, mais poderoso do que nunca com o rompe-tormentas em mãos, Groot (que tem uma troca de cumprimentos hilária com o Capitão) e Rocky (que tem uma cena hilária com Bucky) – o trio parece emular Aragorn, Legolas e Gimli desembarcando com o Exército dos Mortos em O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei, só que aqui o exército inteiro é Thor, definitivamente mostrando-se o herói mais poderoso da Marvel nos cinemas.

Mas a melhor sequência de todas, o grande destaque do filme, acontece em Titã: Homem de Ferro, Senhor das Estrelas, Doutor Estranho, Homem-Aranha, Nebula, Drax e Mantis contra um Thanos em posse de cinco das seis joias. Todo o combate é um deslumbre: do plano que quase dá certo até ruir diante da intempestividade de Peter Quill ao massacre que vem depois, a coreografia impressiona. Os heróis lançam uma nave contra Thanos, mas o Titã Louco manipula uma lua na órbita contra o Homem de Ferro; Doutor Estranho cria múltiplas cópias de si mesmo, usa as dimensões espelhadas, abre portais para ataques diretos do Senhor das Estrelas e do Homem-Aranha, que acerta o Titã em cheio e enche seu rosto de teias. Depois, Thanos destrói pedaço a pedaço da armadura do Homem de Ferro a cada soco, até quase matá-lo com uma parte dela. E ruma para a Terra em busca da última joia.

O que ocorre então, tanto em Titã quanto em Wakanda, é um final inesperado, poderoso e emocionante. Não há piedade nem misericórdia. Thanos derruba todos os heróis em Wakanda com extrema facilidade e toma a joia do Visão, apesar do esforço absurdo da Feiticeira Escarlate para impedir que isso aconteça. Thor se lança em um único ataque certeiro e mortal – a última esperança de salvação. Talvez o ato final da única realidade em que os heróis poderiam vencer entre os mais de 14 milhões de futuros vislumbrados pelo Doutor Estranho com a joia do tempo – talvez. Só que não adianta. Thanos consegue o seu objetivo. Um estalar de dedos e metade dos seres vivos de todo o universo começa a desaparecer. Herói a herói vai sumindo como pó diante dos olhos incrédulos daqueles que permanecem. É deveras pungente o desespero de Peter Parker falando que não quer morrer enquanto cai e desaparece nos braços de Tony Stark, bem como Okoye sem rumo diante do desaparecimento de T´Challa.

Thanos venceu. Se há esperança para todos aqueles que ficam, ela só será conhecida na continuação – o plano desconhecido do Doutor Estranho, o Homem-Formiga (Paul Rudd), a Vespa (Evangeline Lilly), e a Capitã Marvel (Brie Larson), última cartada de Nick Fury (Samuel L. Jackson), já na cena pós-créditos, terão papéis cruciais. Em Vingadores: Guerra Infinita todos os anseios dos heróis foram pulverizados, suas certezas destruídas. Uma belíssima cena que parece ocorrer dentro da joia da alma, com um Thanos despertando na água e encontrando uma Gamora ainda menina, antecede um recorte do Titã Louco como um quase “fazendeiro” contemplando o pôr do sol, semblante tranquilo, após cumprir a sua missão. O encerramento incomum para um filme do tipo torna impossível prever como Vingadores 4 irá se movimentar no seguimento dessa trama. É um final inconclusivo, mas que encerra perfeitamente a narrativa construída durante todo o filme e dá o primeiro passo na culminação de uma história que vem sendo contada desde 2008 nos cinemas.

O que Anthony Russo, Joe Russo, Kevin Feige e toda a equipe de Vingadores: Guerra Infinita conseguiram entregar no fim das contas foi um blockbuster perfeito, aquele que é o maior crossover cinematográfico de todos os tempos. O cinema de entretenimento como ele deve ser: uma montanha-russa de sentimentos e sensações. Aventura, ação, drama, humor, tensão, emoção… tudo isso em um filme enxuto, redondo e alucinante, que não para um único instante e entrega ao público tudo o que ele deseja – mas também muita coisa que ele jamais esperaria ver. Sem pretensões de revolucionar o mundo ou a sétima arte, mas com o interesse genuíno de gravar no espectador a certeza de que 10 anos e 18 filmes valeram a pena nessa longa jornada até aqui. E que ainda há potencial para mais 10 anos. E outros 10. De uma história que não irá acabar tão cedo.

Vingadores: Guerra Infinita (Avengers: Infinity War) – EUA, 2018, cor, 152 minutos.
Direção: Anthony Russo e Joe Russo. Roteiro: Christopher Markus e Stephen McFeely. Música: Alan Silvestri. Edição: Jeffrey Ford e Matthew Schmidt. Cinematografia: Trent Opaloch. Elenco: Robert Downey Jr., Chris Evans, Josh Brolin, Chris Pratt, Chris Hemsworth, Mark Ruffalo, Scarlett Johansson, Benedict Cumberbatch, Don Cheadle, Tom Holland, Chadwick Boseman, Paul Bettany, Elizabeth Olsen, Anthony Mackie, Sebastian Stan, Tom Hiddleston, Danai Gurira, Letitia Wright, Winston Duke, Dave Bautista, Zoe Saldana, Bradley Cooper, Vin Diesel, Pom Klementieff, Karen Gillan, Benedict Wong, Gwyneth Paltrow, Idris Elba, Benicio del Toro, William Hurt, Terry Notary, Tom Vaughan-Lawlor, Carrie Coon, Michael James Shaw, Cobie Smulders, Samuel L. Jackson, Jacob Batalon e Peter Dinklage.

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Sobre o Autor

Católico. Desenvolvedor de eBooks. Um apaixonado por cinema – em especial por western – e literatura. Fã do Surfista Prateado e aficionado pelas obras de Akira Kurosawa, G. K. Chesterton, John Ford, John Wayne e Joseph Ratzinger.