Sou uma gota d’água,
Sou um grão de areia.
Você me diz que seus pais não te entendem,
Mas você não entende seus pais.Você culpa seus pais por tudo, isso é absurdo.
São crianças como você,
O que você vai ser
Quando você crescer.– Renato Russo, na canção Pais e Filhos, da banda Legião Urbana.
Como George Lucas já tinha certeza que conseguiria fazer um terceiro filme, o grande criador da saga deixou inúmeras pontas soltas em Star Wars: O Império Contra-Ataca, e, em decorrência disso, chegou aos cinemas norte-americanos em 25 de maio de 1983 Star Wars: O Retorno de Jedi. É interessante sabermos que o agora nomeado Episódio VI quase se chamou A Vingança dos Jedi, mas Lucas percebeu que “vingança”, embora fosse um título muito mais forte e imponente, não combinava nem um pouco com a palavra “Jedi” que viria logo a frente. Esse título, 22 anos depois, foi utilizado por George Lucas para fechar a segunda trilogia de sua história em uma galáxia muito, muito distante (mas com “Sith” estampando o pôster). Richard Marquand agora era o encarregado por dirigir esse terceiro capítulo da franquia (direção que foi oferecida a Steven Spielberg por Lucas, que não aceitou), que trouxe uma visão menos pessimista e mais alegre que a do filme anterior. Harrison Ford, intérprete do personagem Han Solo gerou alguns problemas durante a pré-produção de O Retorno de Jedi, pois o ator foi relutante em voltar ao papel, alegando que seu personagem não teria mais por onde evoluir e estaria lá apenas para preencher a tela e soltar umas frases legais (estava certo, no fim das contas); somado ao fato de Ford, em 1983, já ter ficado mundialmente conhecido como o caçador de tesouros Indiana Jones. Lucas bateu o pé e convenceu que o ator voltasse, já que Solo era um dos (se não for o mais) personagens mais queridos da franquia.
Esse terceiro capítulo possuía uma nobre missão: terminar toda a jornada dos Skywalkers. E consegue cumpri-la com bastante êxito, embora sofra com alguns defeitos de produção. O Retorno de Jedi, talvez devido à sucessão de um filme com extrema qualidade como O Império Contra-Ataca, obteve um resultado, como um todo, aquém do que muitas pessoas esperavam. O Episódio VI escancaradamente é o que possui a história mais fraca e repleta de enrolações da trilogia clássica de Guerra Nas Estrelas; por mais que tenha toda a jornada de Luke e Vader, na relação entre pai e filho, variando entre emoções sutis e grandes sentimentos, O Retorno de Jedi peca em seus rodeios para preencher 134 minutos de história; mas, ainda assim, é um grande filme.
Os Rebeldes contra-atacam
A história se passa aproximadamente um ano depois dos eventos de O Império Contra-Ataca. O perverso Império Galático, sob a supervisão militar do impiedoso Darth Vader (David Prowse, com voz de James Earl Jones), começou a construção de uma segunda Estrela da Morte, visando aniquilar de vez a Aliança Rebelde. Com o Imperador Palpatine (Ian McDiarmid) planejando supervisionar pessoalmente as etapas finais de sua construção, a Frota Rebelde dá início a um ataque em grande escala à segunda super-arma do Império, para evitar que o término de sua construção, além de e matar Palpatine e pôr efetivamente um fim ao Império. Neste meio tempo, Luke Skywalker (Mark Hamill), aqui já retratado como um líder Rebelde e cavaleiro Jedi, com a ajuda de Leia (Carrie Fisher), Chewbacca (Peter Mayhew), R2-D2 (Kenny Baker) e C-3PO (Anthony Daniels), busca retirar Han Solo (Harrison Ford) das garras do terrível Jabba the Hutt, voltando ao planeta onde cresceu, Tatooine.
Luke agora possui um sabre de luz verde, construído por ele mesmo, e já se apresenta com a imponência de um grande guerreiro. A trupe de amigos consegue resgatar Solo e se juntam com o resto dos Rebeldes na preparação da grande derrocada Imperial. A segunda Estrela da Morte, localizada às proximidades da Lua Florestal de Endor ganha atualmente seus últimos retoques. O jovem Skywalker, além de ter em suas costas a responsabilidade de derrotar o Império, deve confrontar seu pai, Darth Vader, mais uma vez; agora com uma vasta experiência de vantagem, assim como seu velho progenitor. Palpatine, sabendo dos poderes e habilidades que Luke dispõe, convence Vader a tentar, pela última vez, trazê-lo ao Lado Sombrio da Força.
Antes de confrontar seu pai e o Imperador, Skywalker retorna ao planeta pantanoso de Dagobah, buscando novos conselhos do mestre que o treinou, Yoda (Frank Oz). Yoda, em seus últimos minutos de vida, diz a Luke sobre como poderá ser esse embate final, sobre suas chances e perigos, além de revelar que existe outro (ou outra) Skywalker na galáxia, a qual possui sua identidade revelada pela entidade de Obi-Wan Kenobi (Alec Guinness). Além de Luke, existe uma outra esperança, embora o garoto, após o falecimento de Yoda, seja o último Jedi que restou em toda a galáxia.
O Retorno de Jedi, embora possua todo esse embate filosófico entre Vader e Luke, tem um ritmo desacelerado e uma história pouco empolgante. Algumas cenas, como na batalha terrestre na Lua de Endor, são chatas e cartunescas demais, não lembrando nem um pouco as lutas e desafios enfrentados pelos personagens nos filmes anteriores, que eram de tirar o fôlego. Implementados à mitologia da saga, também, estão os Ewoks, pequenas criaturas (que lembram ursinhos mal encarados) que vivem no corpo celeste próximo à super-arma do Império; eles tomam muito tempo de tela e não fazem bem à todo escopo que vinha sendo construído desde Uma Nova Esperança por George Lucas. Aqui, o criador da saga já mostrava o seu lado voltado para o marketing, onde sua ganância em vender bonecos estava começando a crescer. As pequenas criaturas são extremamente bobas e sem graça e, possivelmente, atraem e chamam atenção apenas das crianças. Se pararmos para analisar, o Episódio VI possui diversas partes em que o roteiro de Lawrence Kasdan e George Lucas patinam, já que não vão direto ao ponto. Jogam em tela vários enxertos para tamparem o buraco e conseguirem uma duração cinematográfica considerável. Luke lutando contra um monstro gigante após cair em um calabouço no lar de Jabba, C-3PO sendo tratado como “Deus” e parando por vários minutos para contar sua história e de seus amigos para os bichinhos irritantes (que reagem assustadoramente, tentando parecer fofos) são algumas dessas ideias inseridas, que podiam muito bem terem sido deixadas de fora (ou pensadas de uma forma melhor).
A jornada de alguns personagens, como Han Solo e Leia, também não agrada. Os personagens pararam no tempo desde as aventuras do Episódio V e não evoluem, ou acrescentam, quase nada. Leia, por ter seu arco ao lado de Luke ainda tem uma importância considerável, mas só. A batalha espacial, acima de Endor, é mais contemplativa. Alguns takes remetem à passagens dos filmes anteriores, mas não inovam, caem na mesmice, sem se arriscar. Sem falar que os efeitos não estão tão bonitos que os mostrados em Uma Nova Esperança e O Império Contra-Ataca; o que é preocupante visto que O Retorno de Jedi foi lançado depois desses dois longas (isso vale para todos os momentos em que o CGI é utilizado, do inicio ao final da película). O Episódio VI envelheceu mal, não só em efeitos mas também em narrativa. Poderia ter sido um desfecho bem melhor para a saga de Vader.
Filho contra pai
Porém, o filme também tem suas qualidades. Ou melhor, sua qualidade. Se tem uma coisa em que O Retorno de Jedi faz bem, com maestria, é todo o arco final de pai e filho. Luke Skywalker se entrega para poder encarar seu pai psicologicamente, acreditando que, em algum lugar, Anakin Skywalker ainda vive; que, em algum lugar, ainda resta bondade dentro daquele ser metade máquina, metade homem. Os diálogos, os embates e, melhor ainda, as personalidades dos personagens, são sensacionais. São momentos intocáveis. Que fazem todos aqueles momentos ruins serem deixados de lado e o filme valer a pena. E aí fica a pergunta… por que o George Lucas não optou por mostrar mais desse lado da história durante o filme? Com certeza tinha potencial para ser ainda melhor que seu antecessor.
Luke: “Anakin é o seu verdadeiro nome, você apenas se esqueceu disso. Eu sei que há bondade em você. O Imperador não te dominou completamente. Eu sinto seu conflito. Liberte-se do ódio.”
Vader: “É tarde demais para mim, filho.”
Em sua tentativa de trazer seu pai de volta ao lado luminoso, Luke Skywalker é levado até o Imperador Palpatine, o grande ser por trás do Império. Palpatine é um ótimo vilão, incrivelmente ameaçador e com um visual asqueroso (eu, por exemplo, sempre morri de medo quando era mais novo e o personagem aparecia em tela). Sua pose esquisita e voz calma e imponente, feitas por Ian McDiarmid, dão todo um charme para o personagem, tornando-o inconfundível. McDiarmid executa bem a missão de fazer alguém a quem Vader é subordinado, e, embora o roteiro dê alguns exageros ao personagem, Palpatine é, sem dúvida, um antagonista memorável. Sem que Vader saiba, o Imperador busca que Luke se renda ao lado sombrio e tome o lugar de seu pai, já que o velho Skywalker não é mais o guerreiro que foi um dia. Existem muitos que criticam Mark Hamill e o julgam como um mau ator, e eu discordo. Tudo bem que em Uma Nova Esperança Hamill não tenha conseguido entregar uma atuação muito memorável (embora sempre tenha esbanjado carisma), mas desde O Império Contra-Ataca o ator já mostrou uma tremenda evolução, e aqui nesse terceiro capítulo sua performance atingiu um nível bem aceitável. Toda a interpretação que ele dá ao personagem o engrandece, fazendo de Luke Skywalker um dos melhores e mais nobres cavaleiros Jedi que a galáxia já viu.
Diferente da batalha de O Império Contra-Ataca, a luta entre Luke e Vader aqui é muito mais selvagem e direta, sem rodeios ou cuidados. O sabre de luz verde do jovem loiro está em constante conversão perante o sabre de luz vermelho do ser sombrio, e, lá do fundo, o Imperador assiste a tudo, vendo, aos poucos, Luke se entregando ao ódio e, consequentemente, ao lado sombrio. Mas, para a surpresa de Palpatine, quando Skywalker derrota Vader, o garoto, observando as mãos de seu pai e em seguida as suas, vê que toda aquela raiva não iria levar ele a um bom lugar. Acabaria ali, como Vader; eis então que Luke percebe o que sempre foi destinado a ser. Ele não seria um Sith, como Vader, ele seria um Jedi, como Anakin Skywalker.
“Eu nunca me renderei ao lado sombrio. Eu sou um Jedi, como meu pai foi antes de mim.” – Luke Skywalker.
Todo o desfecho entre Vader, Luke e Palpatine é primoroso, desde as falas até as ações preenchidas de raiva perante o jovem Skywalker que o Imperador adquire. Já que não vai se juntar a ele, sua presença ali era inútil e ele deveria ser sacrificado. Vader, vendo seu filho, que lutou bravamente por levá-lo de volta ao lado luminoso, recebendo inúmeros raios providos pelos poderes de Palpatine, decide tomar uma drástica decisão, avançando em seu mestre e o derrotando. Mesmo sem ver o rosto por trás da máscara, o espectador consegue sentir a dor que o personagem sente naquele momento e entendê-lo sem que o mesmo diga uma única palavra. Ao final, após vários danos acumulados, a armadura de Anakin Skywalker não consegue mais fazer seu hospedeiro respirar e, consequentemente, viver. Logo mais, Vader encontraria seus tristes e últimos instantes de vida.
O Retorno de Jedi nos oferece, sem dúvidas, uma das cenas mais lindas da franquia nesse ato final, mostrando Anakin Skywalker (aqui não mais Darth Vader) sendo levado nos ombros de seu filho, repleto de esperanças em salvá-lo ainda. Luke retira a máscara de Anakin e, pela primeira vez, ambos se olham olho no olho, como pai e filho; embora o velho Skywalker não pudesse permanecer ali por muito tempo. Pessoal, isso é lindo demais. Dando prosseguimento, temos o funeral de Anakin, como nas antigas tradições Jedi, onde seu corpo é cremado. Ninguém, em toda sua jornada, sobrou ao final. Ninguém estava ali, em seu funeral, prestando condolências. Ninguém, além de seu próprio filho, o único que acreditou em sua bondade até o final.
Por mais que toda essa cena final seja memorável e repleta de momentos emocionantes, vale ressaltar que ela promove uma das maiores injustiças da história do cinema. Em um recente documentário, chamado I am Your Father, esse malfeito foi revelado ao mundo. David Prowse, o homem por trás da máscara de Vader, durante toda a trilogia nem ao menos sabia que o personagem retiraria a máscara e teria uma cena final com Mark Hamill. George Lucas optou por esconder isso do ator, já que não queria que seu rosto fosse relacionado com a figura de Anakin Skywalker. Lucas já havia chamado Sebastian Lewis Shaw para fazer esse papel. Prowse ficou completamente chateado e sempre remoeu essa decisão do criador da saga. Fala sério, pessoal… Todos sempre quiseram saber qual era o rosto por trás de uma das máscaras mais famosas do cinema, Prowse tinha o direito de ter feito parte de toda essa jornada final do personagem.
O filme termina com um tom alegre, mostrando os seres de todo o universo repletos de esperança e liberdade. Enfim os tempos sombrios acabaram (pelo menos por enquanto). A trilha sonora, novamente, está magistral. John Williams compõe novas canções, que se relacionam e homenageiam as faixas dos filmes anteriores, sem perder a criatividade.; inova e adiciona a momentos marcantes, como a morte de Vader, um tom muito mais especial, emocionante e épico. O Retorno de Jedi ganhou o Oscar de Melhores Efeitos Especiais, além de ter sido indicado em outras 4 categorias: Melhor Trilha Sonora, Melhor Direção de Arte, Melhor Som e Melhores Efeitos Sonoros.
George Lucas, embora tenha perdido um pouco de tato com o passar dos anos, é, inegavelmente, um dos gênios da história da sétima arte. O diretor e roteirista mudou completamente o cenário hollywoodiano com sua saga intergalática e, muito do que o cinema é hoje, deve-se a ele. Por fim, deixo com vocês a música da qual retirei as frases que abrem o texto, Pais e Filhos, da banda Legião Urbana. Sei que não tem nada a ver com o filme ou com a franquia, mas ela expressa um pouco do sentimento entre pais e filhos, bastante explorado no longa.
O Retorno de Jedi (Return of the Jedi); renomeado para Star Wars – Episódio VI: O Retorno de Jedi (Star Wars – Episode VI: Return of the Jedi) – EUA, 1983, cor, 134 minutos.
Direção: Richard Marquand. Roteiro: Lawrence Kasdan e George Lucas. História: George Lucas. Produção: Howard Kazanjian. Música: John Williams. Cinematografia: Alan Hume. Elenco: Mark Hamill, Harrison Ford, Carrie Fisher, Frank Oz, Billy Dee Williams, Alec Guinness, Kenny Baker, Anthony Daniels, David Prowse, Peter Mayhew, Ian McDiarmid, Sebastian Lewis Shaw, etc.